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Princípios de Reconstrução em Queimaduras
16/08/2014
Publicado por: Luis Fernando Johnston Costa

 


Conceitos Gerais


A reconstrução de uma queimadura é fundamentalmente relacionada com a liberação das contraturas e a correção das alterações de contorno. Todas as queimaduras de segundo e terceiro grau resultam em feridas abertas que se cicatrizam por contração e epitelização. A contração pode ser diminuída com excisão precoce e enxertia, mas sempre estará presente em algum grau, evoluindo para tensão, a qual é uma das principais causas da cicatriz hipertrófica e de cicatrizes desfavoráveis de maneira geral.

Todavia, a reconstrução não deve focalizar a excisão das marcas de queimaduras; uma cicatriz, no máximo, pode ser trocada por outra de uma variedade diferente. Enquanto que, na maioria das vezes, uma ferida por queimadura tende a se tornar mais discreta com maior maturação, a cicatriz cirúrgica, na ausência de uma camuflagem, pode ser mais perceptível do que a cicatriz da queimadura, e a maior tensão provocada pela excisão pode criar deformidade de contorno.

Cicatrizes sob tensão respondem com eritema, hipertrofia, prurido, dor e hipersensibilidade; as sem tensão têm boa evolução e respondem com achatamento, amolecimento e se tornam mais pálidas e assintomáticas. O alívio da tensão e a restauração do contorno normal tanto por liberação e enxertia quanto por zetaplastias são, talvez, o fundamento mais básico de toda a reconstrução de queimados.


Liberação e Enxertia


Geralmente as contraturas de queimaduras são limitadas a cicatrizes ou enxertos superficiais e a uma fina camada de tecido conjuntivo fibroso logo abaixo da superfície cutânea. As estruturas mais abaixo são apenas comprimidas e deslocadas. Deve-se limitar as incisões ou excisões liberadoras, sempre que possível, apenas aos tecidos fibrosos superficiais, a fim de se restaurar o contorno normal da região. As liberações devem sempre tentar hipercorrigir a deformidade da contratura e os enxertos devem ser suturados juntamente com um curativo compressivo.

  1. ZETAPLASTIA: técnica na qual é realizada a transposição do tecido das margens opostas da cicatriz, formando um Z, a fim de escondê-la. Dessa forma, o ramo central é alongado, diminuindo a tensão longitudinal da cicatriz, e a largura da região fibrosada diminui pela transposição medial dos retalhos laterais. Ela também faz a cicatriz menos visível, tornando as suas bordas mais irregulares; a cicatriz hipertrófica se resolve, torna-se mais elástica, bem como mais estreita com o procedimento. A axila, os espaços antecubital e poplíteo são locais freqüentes de contraturas por cicatrizes hipertróficas e corda de arco e quase sempre propícios ao tratamento com zetaplastia.
  2. ENXERTOS: correspondem a um transplante de um segmento de epiderme e/ou derma de espessura variável obtido cirurgicamente caracterizado pela retirada de uma parte de pele de uma região doadora e sua posterior transferência para área receptora sem a manutenção de uma conexão vascular. Os enxertos de espessura parcial se contraem menos e proporcionam uma cobertura de pele mais durável, porém não possuem propriedades elásticas; raramente estão indicados enxertos de espessura parcial em malha na reconstrução de queimaduras. Os de espessura total, no entanto, já são confiáveis para a reconstrução de queimadura facial, pois são elásticos, contraem-se pouco, têm um acabamento com aspecto de pele normal e criam uma superfície durável e que se recupera com facilidade; são mais indicados para a reconstrução de cabeça e pescoço ou da mão.
  3. RETALHO: é a transferência de um segmento de pele e tecido subcutâneo de um determinado local do organismo para outro, mantendo-se o suprimento vascular direto por um pedículo vascular. Os retalhos têm indicação obrigatória em defeitos complexos como articulações abertas ou vasos expostos ou para proporcionar cobertura tissular que permita uma reconstrução complexa posterior. Sua elasticidade e contratura mínima, bem como excelente cor e textura, fazem deles excelente opção, quando disponíveis, para correção de contraturas cervicais.
  4. EXPANSÃO TISSULAR: é um procedimento que permite ao corpo formar pele “extra”, através de sua expansão, para uso na reconstrução. Um balão expansor de silicone é inserido sob a pele próximo a área a ser reparada e, em seguida, gradualmente preenchido com água salina ao longo do tempo, fazendo com que a pele estique e cresça. Em virtude de seu suprimento sanguíneo, forma convexa e o crânio rígido que serve de apoio para a expansão, o couro cabeludo é um local privilegiado para a reconstrução por expansão tissular. Depois da alopecia, a indicação mais comum da expansão tissular é provavelmente a reconstrução de deformidades das queimaduras de face.


Avaliação e Tratamento


A reconstrução de queimaduras é principalmente relacionada com a liberação de contraturas e a correção das alterações de contorno. Quando as contraturas têm, predominantemente, componentes lineares e há um relativo excesso de tecido elástico vascularizado lateral à contratura, a zetaplastia é simples, confiável, e tem a menor morbidade. Também podem ser utilizadas nos componentes lineares mais estreitos de áreas difusas de cicatrizes hipertróficas para separar ilhas de cicatriz e restaurar elasticidade. Após o benefício da revisão inicial, podem-se realizar operações repetidas 1 ou 2 anos depois. Caracteristicamente, essa operação secundária é direcionada para cicatrizes que anteriormente não apareciam ou não eram sintomáticas, porém se tornaram assim após o achatamento, amolecimento e menor percepção das cicatrizes tratadas anteriormente.

Quando as cicatrizes ou enxertos contraídos são difusos e a zetaplastia ou o rearranjo local de retalho não é possível, então, geralmente, a melhor opção para corrigir as contraturas é a liberação e o enxerto de pele de espessura parcial.

Os retalhos são excelentes para contraturas cervicais quando disponíveis. Do contrário, a liberação e a enxertia de pele de espessura parcial geralmente são a melhor opção para o pescoço, embora isso requeira tratamento pós-operatório meticuloso e, muitas vezes, mais de uma liberação e enxertia.

A expansão tissular é o tratamento ideal para a alopecia pós-queimadura. Ela permite que o fechamento da cicatriz seja feito sem tensão ao incorporar retalhos locais interdigitados e zetaplastias que mascaram a cicatriz e evitam seu alargamento. Sempre que possível, é desejável se utilizarem expansores únicos grandes; quanto maior o expansor, menor a separação dos folículos pilosos. Quando a expansão é realizada com um único expansor de grande porte colocado através de uma única incisão pequena, a manipulação do couro cabeludo por ocasião da incisão da alopecia fica facilitada, pois as cicatrizes incisionais têm menos propensão a complicar a confecção dos melhores retalhos possíveis para o fechamento.

A reconstrução de queimadura facial é bastante complicada e vários pontos devem ser avaliados em seu tratamento. Nunca é demais enfatizar a importância do tempo e da maturação máxima da cicatriz, juntamente com o uso de técnicas auxiliares como compressão, gel de silicone, corticóides, intervenção cirúrgica criteriosa e a utilização de laser para eritema.

Em deformidades do tipo I (faces normais com cicatrizes focais ou difusas, com ou sem contraturas), o cirurgião não deve comprometer os traços normais e seus contornos para excisar as cicatrizes; deformidades iatrogênicas podem, facilmente, tornar-se grotescas. A revisão da cicatriz por zetaplastia e retalhos locais geralmente é melhor opção nesses casos.

Em pacientes do tipo II (deformidades panfaciais, apresentando estigmas da queimadura facial), os objetivos cirúrgicos devem ser a restauração das proporções faciais normais e a volta à posição e as formas normais dos traços faciais. Os cosméticos também são bastante eficazes para cobrir e disfarçar as alterações de cor e textura, nesses casos.


Fonte: Grabb and Smith’s plastic surgery.—6th ed. / editor-in-chief, Charles H. Thorne . . . [et al.].